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Nem Zelda: Ocarina of Time, nem Red Dead Redemption 2: BAFTA anuncia lista de "Jogos Mais Influentes de Todos os Tempos" e primeiro lugar é surpreendenteUma questão fundamental que surge com o lançamento de qualquer dispositivo eletrônico é: ele pode rodar DOOM? A icônica obra da id Software, estúdio que lançou recentemente DOOM: The Dark Ages, ganhou edições para todos os tipos de plataformas, e o meme foi levado a níveis absolutamente delirantes, com versões dentro de Fortnite e Minecraft, ou até mesmo geladeiras e calculadoras. No entanto, há uma versão que tem a duvidosa honra de ser a pior dentre todas as feitas do jogo de tiro — e sua história é cheia de reviravoltas inesperadas, ambições sem limites e até mesmo cenas cinematográficas inéditas que o mundo escolheu esquecer para sempre.

Estamos falando do DOOM para o 3DO, sistema que foi projetado com a ideia de que outras empresas (como Panasonic e Sanyo) pagariam a licença para fabricar seus próprios consoles. Desenvolver uma versão do jogo de tiro da id Software para essas especificações foi tão difícil que ninguém se atreveu a iniciar o projeto, mesmo sabendo que seu lucro estava garantido (afinal, estamos falando de um título lendário). No entanto, a Art Data Interactive decidiu arriscar por um motivo muito curioso: seu CEO, Randy Scott, não tinha ideia sobre produção de videogames e achou que o trabalho seria muito simples. E foi Rebecca Heineman, uma designer e programadora lendária do setor, que ficou responsável por essa versão em um sprint de dez semanas até ter uma proposta jogável. Terrível pelo FPS e pelas promessas quebradas, mas jogável mesmo assim. E isso foi um feito enorme.
Uma versão que nem a id Software pensou que poderia ser feita
Antes de continuar, é importante esclarecer de onde vem a Art Data Interactive. Basicamente, estamos falando de uma das muitas empresas que surgiram na década de 1990 para surfar na onda dos videogames. Antes de embarcar em DOOM para o 3DO, a equipe começou suas aventuras com títulos como Rise of the Robots (1994, assistência financeira e distribuição no 3DO) e Nick Faldo's Championship Golf Challenge (1992, versão para MS-DOS). No entanto, Heineman lembrou em uma entrevista concedida em 2015 que toda essa empresa foi fundada com investimentos muito privados, levando assim à portabilidade de DOOM para 3DO. O CEO [Randy Scott] era membro de uma igreja em algum lugar no sul da Califórnia. De alguma forma, ele convenceu seus amigos da igreja e outros de que o 3DO era a onda do futuro e que ele precisava do dinheiro deles para abrir uma empresa de videogames. Só com esses contatos o CEO conseguiu levantar US$ 100.000.
Para ganhar destaque na indústria, Scott teve a ideia de portar DOOM para o 3DO. Mas não estamos falando de uma tarefa simples; como Heineman lembra, a id Software estava pedindo US$ 250.000 de desenvolvedores que queriam a licença para desenvolver e comercializar seu jogo de tiro neste sistema específico. E por que tanto dinheiro? Resumindo, a equipe pensou que tal versão seria praticamente impossível de ser feita. Se alguém quisesse embarcar nessa aventura, teria que ter 100% de certeza de que o projeto poderia ser executado.
E Scott estava convencido de que a Art Data Interactive poderia fazer isso. Além de pagar US$ 250.000 à id Software, o CEO falou com a imprensa e prometeu que o 3DO DOOM teria novos níveis, armas nunca antes vistas e monstros totalmente novos. Mas isso foi apenas o começo de uma jornada turbulenta: em vez de colocar sua empresa no comando do desenvolvimento, o executivo deixou o projeto nas mãos de outros estúdios. A primeira equipe que ele contratou nunca começou a produção porque exigiu dois anos de trabalho e US$ 3 milhões. "Foi outro desenvolvedor que ele de alguma forma convenceu a iniciar o projeto, mas não tinha a intenção de pagá-lo", diz Heineman. Esses últimos profissionais previram o problema e se recusaram a compartilhar o trabalho que haviam feito com Scott, encerrando assim a colaboração.
Em julho de 1995, os chefes da 3DO perceberam que a Art Data Interactive estava descontrolada. Então, para avançar no desenvolvimento de DOOM (um título que, vale lembrar, aumentaria a popularidade do sistema), eles contataram Heineman. "Disseram-me que existia uma versão com novos níveis, armas e recursos, que só precisava de alguns ajustes e otimizações para chegar ao mercado. Após inúmeros pedidos por esta versão, descobri que não existia tal versão e que a Art Data Interactive tinha a falsa impressão de que portar um jogo de uma plataforma para outra era apenas aplicar o código e que adicionar armas era tão simples quanto adicionar a arte para elas", explicou no GitHub. Sem ter nada com que começar a trabalhar, a programadora contatou a id Software para solicitar uma versão própria; dessa forma, obteve o código para o port de DOOM para Atari Jaguar, uma edição mais parecida com o 3DO devido à sua potência. E isso resultou em 10 semanas infernais.

Versão desastrosa e promessas quebradas
O problema com tudo isso é que a Art Data Interactive e a 3DO só tiveram a licença para desenvolver e distribuir DOOM por um tempo limitado. Em outras palavras, o título de 3DO tinha que estar pronto até o Natal de 1995. Assim, Heineman decidiu fazer uma versão exatamente igual ao Atari Jaguar em termos de conteúdo e ignorar todas as novidades que Scott havia prometido à imprensa. "Ele realmente acreditava que se eu desenhasse uma arma — ele apenas me enviou o arquivo de arte — eu poderia colocá-la no jogo e ela dispararia balas magicamente ", disse a programador na entrevista.
Como se isso não bastasse, o CEO da Art Data Interactive queria que DOOM para 3DO tivesse cinemáticas. De fato, Scott usou equipamentos de produção alugados para fazer cenas live-action de cavaleiros, cavalos e reis para Chess Wars (1996) e realizou uma sessão com atores e figurinos que representou momentos totalmente inusitados de DOOM. Evidentemente, Heineman rejeitou tudo isso e se concentrou apenas em criar um título jogável.
No fim, DOOM de 3DO deu terrivelmente errado. Entre as dificuldades inerentes ao sistema e o tempo limitado que a programadora tinha para fazer seu trabalho, o público acabou recebendo uma versão com problemas de framerate. Na verdade, a tela do jogo ficou menor que o normal porque mal conseguia manter uma taxa de FPS estável (mas não muito alta). "Finalmente, consegui deixar o jogo basicamente pronto para ser lançado. Não o considero 'finalizado', apenas digo que estava pronto para ser lançado ", disse Heineman na entrevista.
Como esperado, a imprensa e os jogadores criticaram esta versão estranha de DOOM para 3DO. A título de curiosidade, a trilha sonora foi um dos aspectos mais aplaudidos da experiência. Aproveitando que Scott tinha uma banda com alguns amigos, Heineman o convenceu a refazer todos os temas originais de DOOM, o que resultou em uma trilha sonora diferente e bastante aceitável. Ainda assim, esse título entrou para a história como a pior adaptação do jogo de tiro já feita, e isso apesar de estarmos falando do título mais portado de todos os tempos. E Heineman, pelo menos, pôde trabalhar em outros projetos como GoldenEye: Rogue Agent, Icewind Dale (versão para Mac) e Baldur's Gate II: Shadows of Amn (versão para Mac) até se consolidar como uma figura reconhecida no setor.
Texto adaptado do site parceiro 3D Juegos*
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